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O melhor detergente é a luz do sol

SEBASTIÃO CARLOS: Tributo a João Antônio Neto, um mestre centenário

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O melhor detergente é a luz do sol

TRIBUTO A UM MESTRE CENTENÁRIO 

Sebastião Carlos 

Poucas vezes nos é dado, ainda que de longe, comemorar o natalício de uma  pessoa que chega ao centenário de vida. Menos ainda de alguém que nos foi próximo e pelo qual se nutre justa admiração. Este, sobre o qual a data de 19 de  abril lhe é comemorativa, é digno de lembrança e é superlativo em ambos os  casos: o da longevidade e o do reconhecimento. Refiro-me à figura imensa que,  há exatos 105 anos, atende pelo nome de João Antônio Neto. 

Que não é um só: é múltiplo, são diversos. Nessa figura esguia, de porte  altaneiro, de reconhecida fidalguia, conjugam-se o intelectual, o professor, o  jurista, o pesquisador, o poeta. Aqui está alguém a sobre ele falar que dele  conhecia antes de o conhecer. Relembro-me, mal chegado aos 14 anos, conversa  em Guiratinga com Raimundo Maranhão Ayres, amigo de longa data de meu pai, colegas que eram da FBC, e figura marcante da cultura centro-oestina que lá  residia desde 1945 e que convivera com o jovem advogado João Antônio, membro  da respeitada família Antunes, filho de “seu” Pedro e de Da. Inezila, vindos de  Couto de Magalhães [Goiás, hoje Tocantins]. Sobre ele se referia com estima e  admiração, falando sobre a sua cultura, inteligência e retidão de caráter. Ao  depois, quem dele me disse com idêntica admiração, foi um obstinado militante político, um dos fundadores do corajoso Movimento Democrático Brasileiro,  organizado em Mato Grosso sob a batuta do bravo Senador petebista Vicente  Bezerra Neto. Natalino Antunes, seu irmão, de quem me tornaria também amigo.  

Muitos anos então se passaram e, em 1985, dele tive o apoio entusiástico e  recebi o voto consagrador para me tornar um dos mais jovens membros da  história da Academia Mato-Grossense de Letras. A oração de recepção por ele  proferida foi de uma eloquente generosidade, pela qual serei sempre grato. Três  anos depois, como presidente da Fundação Cultural de Mato Grosso, publiquei seu livro ‘Silhuetas & [in] significâncias’, numa coleção reunindo seis poetas, e  em que estavam outros representativos nomes da poesia neste Estado: Ricardo  Guilherme Dick [com seu primeiro livro de poemas], Silva Freire, Ronaldo de  Castro [seu único livro publicado], Pedro Casaldáliga. 

Sobre o perfil plurifacetado de João Antônio Neto, em que se torna difícil  distingui-lo pelo ângulo que mais o destaca, vem sendo escrito e relatado. Sobre  o jurista, juiz e desembargador, seus colegas de magistratura o recordam sempre com justa admiração; sobre o professor e pesquisador de Direito seus inúmeros  alunos dele se lembram com elevado reconhecimento; sobre a sua presença  marcante no convívio social da cuiabania os mais antigos a ele se referem com o  respeito da amizade. Premido pelo curto espaço de que aqui me é permitido, devo  falar sobre o literato, sobre o poeta. 

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Em livro que publiquei há 22 anos, “A Poesia em Mato Grosso – Um  percurso histórico de dois séculos”, no qual realizo um esboço crítico da poesia  aqui realizada desde fins do século XVIII, iniciando com o Romantismo,  passando pelo Parnasianismo e pelo Simbolismo, e chegando ao século XX com  o Modernismo, sublinho a atuação de nosso poeta. Nesse contexto dos anos  quarenta e cinquenta, que foi grandemente produtivo para a cultura literária de  nosso Estado, e em que já publicara ‘Vozes do Coração’ (1941) e ‘Três Gerações’  (1949), ele surge também como agitador cultural. Com Rubens de Castro e  Agenor Ferreira Leão fazem circular a revista ‘Ganga’. Escrevem artigos, geram  polêmicas, contribuem para movimentar o cenário intelectual da época. João  Antônio é autor de um audacioso artigo no qual comemora e saúda o  aparecimento nas letras matogrossenses daquele que iria se tornar um dos  grandes poetas de Mato Grosso, o jovem corumbaense Lobivar Matos o que, por  primeiro, para cá trouxe os ares renovadores do movimento modernista. 

Então, escrevi sobre ele: “João Antônio Neto é uma das figuras mais  interessantes de nosso mundo cultural e transbordando seu saber nos vários  campos da literatura se dedica a um fazer poético que leva à reflexão, que  conduz a uma insuspeita autoironia, que filosofa em torno das misérias e  grandezas da existência humana, sempre com uma verve inquieta e  pontiaguda. Em ‘Remanso’, de 1982, não pretendeu talvez ensaiar uma  autodefinição de sua função de poeta? : [“Somente rindo, fazer rir, me cabe / Por  isso, toda gente nunca sabe / quando estou rindo ou quando estou chorando.]. Em  ‘Silhuentas & [in] significâncias’ […] ele nos traz poemas sintéticos, quase digo  micro poemas, afiados como lâminas, irônicos e cortantes na melhor tradição  de Matos Guerra. […]. Provocador, inquieto e irreverente, Antônio Neto elabora 

uma obra ao mesmo tempo sensível e reflexiva ao modo de Cioran. Não há como  deixar de situar este poeta como estando entre os melhores que neste Estado já  se aventuraram no reino da poesia e, seguramente, oxalá, ainda o veremos  colocados entre os melhores do país, na atualidade.” 

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Desde a minha posse na Cadeira 40, e por mais de vinte anos por, pelo  menos uma vez por mês, com ele convivi nas reuniões da AML. Com ele muito  aprendi não apenas as coisas do saber, como igualmente as lições do viver. A ele  me posso referir com mestre. 

O destino me propiciou a sorte em ter duas grandes figuras longevas como  membros da Academia Mato-Grossense de Letras na mesma época em que nela  adentrei. Ambos com grande empatia, com os quais pude desfrutar de  admiradora amizade. A outra, foi uma das maiores personalidades femininas da  História de Mato Grosso, igualmente extremamente lúcida: a poeta e cronista  Maria de Arruda Müller que, aos 98 anos, de próprio punho, escreveu – me de  modo tão comovente e nobre, [“ao amigo e confrade Carlos”] cumprimentando-me  por minha produção intelectual. Uma carta que a recebi como uma condecoração,  a guardo com desvelo e a publiquei em um de meus livros.  

Ambos, Maria de Arruda Müller [9/12/1898 – 4/12/2003] e João Antônio  Neto [1920], campeões em uma vida rica em sabedoria, pródiga em realizações,  de vasta generosidade. Ambos, centenários que, num raro feito, atravessaram  dois séculos de existência. Ambos se tornaram mais antigos que as duas  instituições mais tradicionais de Mato Grosso: o Instituto Histórico [1919] e a  Academia Mato-Grossense de Letras [1921].  

A estes me posso referir no sentido mais adequado e lato da palavra: mestre.  Termo este que se vulgarizou, mas cujo significado faço aqui inserir no contexto  em que teve origem: o de magister, mestre, maestro, aquele que simultaneamente  reúne conhecimento e sabedoria. Já sabemos que nem todos que muito conhecem têm sabedoria, enquanto esta é ancestral e ampla, universalizante e perene, 

aquele é atual, particularizado e pode se tornar finito. Mas a ambos posso dizer  que, nos passam a lição, tão bem expressa por Lúcio Aneu Sêneca [cerca de 4 a.C. – Roma, 65]: “O mais importante não é quanto tempo você viveu, mas quão bem  você viveu”. Estes são mestres a serem homenageados. Ainda bem que temos um  entre nós. 

Longa vida a João Antônio Neto. 

________________________________ 

Sebastião Carlos Gomes de Carvalho é advogado e professor. Membro, entre outras  instituições, do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, da Academia Paulista de Letras  Jurídicas. 

João Antônio Neto e Sebastião Carlos

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EDMUNDO LIMA DE ARRUDA JR: Na sucessão de Barroso, Lênio Streck desnivela qualquer outro candidato para vaga no STF

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Não há dúvidas. Lênio Streck é hoje o jurista mais preparado para os desafios naquele padrão Supremo. O STF merece nomes do mais alto nível entre nossas mentes na área do Direito.

A escolha é política e causa uma mistura de surpresa e espanto ao pipocar de nomes: o Advogado geral da União, Jorge Messias, preparadíssimo, parece forte, mas ainda consolidando seu nome no meio jurídico.

A Janja quer, por critérios de amizade, Carol Proner, esposa de Chico Buarque, pouco expressiva em trabalhos com a técnica jurídica e na teoria da hermenêutica constitucional.

Lenio talvez seja grande demais para merecer a confiança de Lula num contexto no qual nosso presidente já se decepcionou com muitas de suas escolhas e se vê pressionado por uma militância conhecida… .

Lênio desnivela qualquer outro candidato, por melhor seja o currículo de muitos disponíveis, por erudição, produção acadêmica e técnica, visão crítica, múltiplas capacidades no raciocínio jurídico, sobretudo, pela coragem e criatividade nos fundamentos da interpretação constitucional.

Em cinco anos produziria uma revolução na nossa mais alta Corte.

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Edmundo Arruda, sociólogo e jurista, nascido em Cuiabá, MT, vive há tempo em Florianópolis, SC

 

Lênio Streck com Edmundo Arruda em solenidade em Florianópolis

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