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O melhor detergente é a luz do sol

ENOCK CAVALCANTI: Agro é pop, Agro é tudo, Agro é até Lula e PT em Mato Grosso

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O melhor detergente é a luz do sol

Agro é pop, Agro é tudo, Agro é até Lula e PT em Mato Grosso

Por Enock Cavalcanti

Meus amigos, meus inimigos: sigo com minhas anotações sobre a disputa eleitoral deste ano de 2022 em Mato Grosso. Registrar é preciso. Lanço meu vesgo olhar sobre a conjuntura e é evidente que jamais conseguirei retratar tudo que há. Essa é só uma parte do todo que muitos estão escrevendo.

No plano nacional, muitas lideranças petistas, no inicio do ano, rodaram a baiana quando Lula e a cúpula reformista do PT resolveram impor o tucano Geraldo Alckmin como candidato a vice presidente na chapa do povo, na chapa da reconstrução nacional. A esquerda do PT esperneou mas teve que engolir o sapo tucano e Alckmin é hoje a sorridente contradição no palanque da esperança, parceiro de Lula na disputa contra o capitalismo sanguinolento do capetão Bolsonaro. Muitos já começaram a rezar para que o velho metalúrgico tenha a saúde necessária para levar estes 4 anos de governo até o seu final.

Para as bases petistas, Alckmin e determinadas alianças esquisitas são vendidas como um mal menor. O PT que já elegeu a primeira mulher presidenta não teve folêgo nesta campanha pra cogitar sequer escolher uma mulher feminista como vice. Ou um ativista negro, ou um ativista gay. Ou um ambientalista de quatro costados. Ou um/uma artista que incorporasse todos esses ativismos. O vice foi escolhido com a missão esquisita de acalmar o mercado, como se fosse possível acalmar o mercado ao mesmo tempo que você tenta construir no Brasil um país que viabilize a caminhada de nossa sociedade para o socialismo civilizatório. Mas prioritário mesmo é derrotar Bolsonaro, pelo menos é o que defendem os pragmáticos do PT que seguem dominando e domando o partido. Mas, nesse imbroglio todo, o que fazer com os micropoderes de que falou o filósofo francês Michel Foucault? Ou será que Fukô não deve mais ser considerado?!

Em Mato Grosso, Lula e a cúpula do PT estão muito interessados em conquistar para seu palanque a elite do Agro, os barões do Agro, bem representados por Blairo e Erai Maggi e seus parceiros também endinheirados. E nessa leva, é claro, vem no pacote, tipos como Eder Moraes, candidato a estadual pelo PV. A diferença é que aqui em Mato Grosso a esquerda petista é fracote, não tem base de massa, não conseguiu ampliar seu poder interno, desde que o pessoal de O Trabalho abraçou a corrente Construindo um Novo Brasil e desde que a transferência de Gilney Viana para Brasília esvaziou o discurso ecossocialista da Utopia e Vida. Então, a candidatura de Domingos Garcia fica valendo pro consumo interno, para divertir os jovens pretensamente radicais da Juventude Revolução, do Levante Popular da Juventude, enquanto, dentro da federação formada pelo PT com PV e PC do B, líderes como Valdir Barranco e Rosa Neide e Maria Lúcia Cavalli e José Roberto Stoppa (“cavalo”, como na umbanda, a serviço de Emanuel Pinheiro) , vibram com a aproximação com Neri Geller para o Senado e, quem sabe, Percival Muniz pro governo. No final, uma campanha tão ruralista pode até mesmo facilitar para que o poder caia mais uma vez no colo de Mauro Mendes já que os confrontos de teses e programas se diluem. Seria outra coisa, certamente, se o professor trotskista Domingos Garcia fosse de fato o timoneiro da campanha, com Enelinda Scala para o Senado.

Recordar é viver e, em alguns casos, sofrer duas vezes. Em 2018, o PT fez campanha pra Wellington Fagundes Governador, um candidato que nem falava em Fernando Haddad Presidente e ficou tudo por isso mesmo. Em algum lugar deste palanque de 2022 pode ser que o PT e Wellington se encontrem novamente, já que todo mundo sabe que Wellington detesta ser de oposição e se Lula despontar muito forte na campanha, será muito lógico e natural Wellington mudar de lado, como ele já mudou de lado tantas vezes. Com Lula abençoado pelos Maggi e pelo Agro, até Mauro Mendes de repente pode perder o medo de se aproximar, em algum tipo de palanque, da jararaca petista.

Ah, essa campanha tá muito enrolada, o jogo nas cúpulas é como briga de foice no escuro e o povão não dispõe de instrumentos de informação e de análise para melhor se posicionar. Para certos líderes progressistas, esse negocio de um partido construido pela base não passa de discurso utilitarista – e Paulo Freire é só um retrato na parede. E desde quando o povão precisa se posicionar, neste grande partido de massas em que se transformou o PT, interessado basicamentee em eleição, embora o MST fique gravitando em torno dele, falando em revolução mas respaldando a política eleitoral dos caciques petistas, sem que se veja uma só problematização expressiva?!

Esse é o Mato Grosso em que Mauro Mendes, Fábio Garcia e Eduardo Botelho já posaram até de socialistas, controlando o PSB. Agora a expressão máxima do “socialismo” em Mato Grosso está na figura de Max Russi que, de prefeito discreto em Jaciara, secretário de Zé Pedro Taques, vai se erguendo como um dos membros do trio que controla os ricos cofres da Assembleia Legislativa que, como se sabe, seguem sendo cofres incontroláveis. Max Russi, Janaina Riva e Eduardo Botelho. O poder gravita em torno desses tres politicos lá no Parlamento estadual e quem pensou que o bafafá em torno das emendas parlamentares que alimentaram a farra de Jajah Neves em VG iria desaguar numa CPI, pode tirar o cavalinho da chuva, porque nesta Assembleia não se investiga nada, vai tudo pra debaixo do tapete e, em alguns casos, talvez vá até pro bolso dos deputados, sob a forma de rachadinha, segundo se conta – e não existe um membro sequer do Ministério Público Estadual que se preocupe com esse possível descalabro.

Ou restaure-se a moral ou nos locupletemos todos. A máxima do falecido humorista Millôr Fernandes (ou será que foi do Stanislaw Ponte Preta?) serve como uma luva pra a política e os políticos de Mato Grosso.

Jajah Neves já foi denunciado aos berros pela deputada Janaina Riva, acusado de rachar ilegalmente sua verba de gabinete com o deputado Wilson Santos, que lhe deu um mandato provisório enquanto ia pra Secretaria de Cidades, ajudar a afundar ainda mais o desastroso governo de Zé Pedro Taques. O que resultou dos berros e acusações de Janaina Riva na tribuna do parlamento? Foi tudo pro arquivo, os mandatos dos deputados da rachadinha foram preservados e agora Jajah já está fazendo politica de novo, a serviço de Botelho, como bem remunerado cabo eleitoral em VG e controlando o Pros, que já fora o partido de Gisela Simona, nossa Viuva Porcina, aquela que foi sem nunca ter sido. Gisela tentou se pintar como mulher que traria a renovação para a política mato- grossense mas onde é que essa mulher foi parar mesmo, minha gente? Será que o meu amigo e advogado Cadu Feguri é capaz de dizer?! Só sei que nada sei. E sei muito pouco do Pros, partido que teria comprado uma sentença de um desembargador em Brasília para garantir o controle dos milhões do Fundo Partidário nas mãos do seu atual presidente Marcus Hollanda, conforme o noticiário desta semana.

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Enquanto em Mato Grosso tem muita gente que pensa que sabe muito, eu, Enock Cavalcanti cito o poeta mineiro Drummond, aparentado com o veterano Eduardo Gomes de Andrade – e só sinto muito.

Quanto tempo perdido, quanto tempo por perder. Quanto gente perdida – e os mais perdidos são a gente do povo, que, em Mato Grosso, talvez não tenha Lula para liderar suas causas, pois Lula, parece dar mais ouvidos a Blairo e Eraí Maggi, barões do Agro, do que à multidão de deserdados que busca um lugar ao sol aqui em Mato Grosso.. O povo vai descobrindo assim (sic) que mesmo o tão admirável Lula também vive e propaga contradições em sua caminhada. (É tão difícil o povo descobrir as coisas, anoto en passant.)

Quem é que soube de alguma iniciativa de Lula no sentido de ouvir as bases do PT de Mato Grosso para definir os rumos do partido neste Estado estratégicamente e economicamente tão importante para os rumos do Brasil e do mundo? As decisões do PT sobre os rumos do PT em Mato Grosso foram definidas, ao que se sabe, nos gabinetes da cúpula do PT em São Paulo, em Brasília, lá onde se reunem aqueles que vão definindo táticas e estratégia que interessam ao grande e inegável lider em que se transformou o Cabeça Branca. PT, um partido, uma pessoa. Depois do Pecebão e de Luis Carlos Prestes, eis que Lula é o novo Cavaleiro da Esperança. Quando menos se esperava, explodiu na mídia mato-grossense a noticia de que Neri Geller se reunira com Gleisi Hoffman e que um pacto do PT com PP estava sendo engendrado, com a benção do Artur Lira e do Ciro Nogueira, em Brasília, e do Pedro Henry, em Cáceres.

Mas tantos líderes já passaram por esse mundo e vejam os impasses estratósfericos em que nos encontramos. Até água e oxigênio começam a nos faltar. A água, em muitos municipios do Brasil, como aqui em Cuiabá, foi privatizada, virou mercadoria para dar lucros aos patrões mais espertos nessa atual conjuntura. Esses patrões espertos que por aqui são chamados também de barões do Agro e já estão dando um jeito de subordinar Lula e sua campanha de “reconstrução do Brasil” de acordo com os seus interesses corporativos. E a reconstrução corre o risco de se transmutar apenas em um puxadinho, em que se preservarão as favelas, as comunidades, os acampamentos, as palafitas, onde a plebe rude se junta tentando encontrar uma razão pra viver. Enquanto os aviões do Agro despejam nuvens de veneno sobre as lavouras que vão alimentar porcos e bois pelo mundo afora.

Discutir a Lei Kandir para acabar com ela e com os privilégios fiscais que garante para quem enrica produzindo commodities para exportação?! Não pense nisso, não fale nisso, a campanha da federação do Lula, pelo que se sabe, não prioriza este aspecto do problema. Esquerda e Direita e Agronegocio confundem tanto as suas pernas aqui em Mato Grosso que a campanha de Neri Geller com Lula pode ser a mesma campanha de Neri Geller com Mauro Mendes, com Blairo e Eraí Maggi, com Cidinho, com Nininho, com Abilinho, com tudo. Beto Dois a Um, homem do Mauro e do Botelho, já arrumou legenda no PSB junto com Allan Kardec para alavancar a candidatura de Max Russi a deputado estadual e para garantir que continue controlando os cordéis das votações e da grana na Assembleia Legislativa, onde ele sempre foi e continuará sendo homem do Mauro Mendes. Deu pra entender?! Em Mato Grosso o “socialismo” do PSB é como uma camisinha de Vênus que se usa e se descarta depois de ferrar com o povo e aprovar no parlamento tudo que o Agronegócio manda e deseja. E tudo isso cabe na campanha do Lulinha Paz e Amor, até mesmo o Max Russi que não queria porque não queria que o PSB embarcasse na campanha do Lula.

Lula e a cúpula do PT empurram o partido em Mato Grosso para o colo do Agro mas o deputado estadual petista Lúdio Cabral felizmente reage, diz que o PT não precisa passar por esse vexame. O agronegócio tem representantes políticos, que de forma oportunista, estão buscando aproximação com a candidatura do Lula, mesmo fazendo parte da base de sustentação do governo Bolsonaro. É uma contradição. Na minha opinião, o PT e o Lula não precisam do agronegócio em Mato Grosso. Não precisa, não tem essa necessidade”,

Lúdio Cabral, segundo a jornalista Camila Zeni, no Repórter MT, citou a fila de pessoas para receber doação de “ossinhos” em açougues e mais de 500 mil pessoas que estariam passando fome no Estado. Segundo Lúdio, esse cenário é culpa do Agronegócio. O agro detém poder econômico no Estado, que é o responsável pelas contradições que o Estado tem. Se nós temos fila do osso em Mato Grosso, isso se deve a uma política de preços que enriquece os poderosos do agronegócio. Temos 500 mil pessoas passando fome, ao mesmo tempo em que o Estado exporta milhões e milhões de toneladas de soja, em dólar, para enriquecer alguns poucos”, afirma. Representantes de vários partidos, que representam o Agronegócio, se reuniram com Lula em São Paulo. Lúdio diz que não foi à tal reunião para “não ter o desconforto de dividir a mesma mesa” com eles. Eu não queria vivenciar o desconforto de estar ao lado de representantes políticos do agronegócio na mesma mesa. Não podemos cometer esse erro”, afirmou o petista Lúdio Cabral.

Leia Também:  JORNALISTA PABLO RODRIGO: O monopólio da mídia mundial, vem perdendo espaços, credibilidade e lucros, provando assim, que a tal “liberdade de imprensa” pregada pelos barões da mídia é apenas uma falácia, que na verdade representa a "liberdade dos monopólios". As mídias sociais tem dado voz à população, democratizando a informação

Ora, ora Lúdio Cabral, sua reação agora merece registro mas o nobre deputado sempre deteve o poder de desarmar essa palanque oportunista em Mato Groso, mas no meu entendimento se omitiu, evitando assumir a candidatura petista ao Governo do Estado. (Se omitiu até mesmo não indo a essa reunião de conchavo em São Paulo pois certamente a coisa seria outra se ele, um parlamentar popularmente tão respaldado aparecesse no encontro, batesse na mesa e dissesse NÃO!) Sem a candidatura do Lúdio, abriu-se o campo para todas estas articulações perversas que hoje se vê e, mais uma vez o Lúdio, que já esteve a serviço de Maggi e Silval no passado, que arrastou a campanha do bolsonarista Wellington pra governador em 2018, deve ter que arrastar a campanha do bolsonarista Neri Geller para senador em 2022, com toda possibilidade de fazer também campanha enviezada para Mauro Mendes governador e Bolsonaro presidente, porque esse é um palanque construido com muito oportunismo e não será surpresa que um palanque assim se multiplique em oportunismos sem fim. Dize-me com quem andas e te direi quem és, conforme registro da sabedoria popular.

A subordinação do PT e de muitos petistas ao Agro, em Mato Grosso, vai produzir certamente uma forte aresta para incomodar o futuro governo de Lula, a partir aqui de nossa região. A tentativa de pacificação por cima, com Lula e sua campanha e talvez seu novo governo se curvando aos barões do Agro, não acaba com os conflitos pela base, onde defensores do Agronegócio seguem se confrontando sem cessar com os defensores da Agroecologia. Lula e o PT tentam construir pontes para que esse conflito não se radicalize – mas será possível?!

Todos nós vemos os ideólogos do Agro afirmando que o Agro é Pop e que as lavouras brasileiras alimentam o mundo. A Rede Globo fatura esse discurso como fatura tudo que for possível faturar. Discurso que é desmontado de chofre pela realidade em derredor, já que nosso Agro mato-grossense não tem sido produtivo o bastante para matar sequer a fome do povo mato-grossense. Por aqui continuamos vendo a fome se espalhar em meio a grandes plantações, como já identificara o poeta Geraldo Vandré. Os ossinhos distribuidos para os famélicos cuiabanos faz sórdido contraste com a fortuna acumulada pela veneranda senhora Lúcia Borges Maggi, aqui de Mato Grosso, uma das mulheres mais ricas do mundo, de todo o planeta Terra, segundo dados internacionais.

A contradição de Lula abraçar os barões do Agro é uma contradição enorme porque eles sempre serviram e se serviram de Bolsonaro e Neri Geller nunca negou qual é sua turma e o que é que ele defende. Mas alguns esquerdistas preferem certamente fazer campanha cortando os céus de Mato Grosso nos confortáveis jatinhos do Agro do que calcorrear o barro das estradas intrafegáveis do interior deste Estado atrás do voto popular.

O pacto da campanha Lula com os barões do Agro e seus candidatos-marionetes é um pacto da elite. Não há lugar para os famintos e desertados nesta seleta mesa. A campanha seria justamente o momento de agitar bandeiras políticas que emparedassem o Agro e revelassem as suas contradições, direcionando o poder no rumo de uma forte transformação econômica do Brasil. Mas como gritar essas bandeiras se lá nas cúpulas partidárias Blairo e Eraí Maggi já estão enchendo de mel e suco Melina a boquinha dos pretensos líderes da esquerda mato-grossense e brasileira?!!

Dia desses, o jornalista Gibran Lachowski me fez recordar aquele histórico poema de Agostinho Neto, um dos líderes da emancipação política do povo em Angola, o presidente poeta que falava da necessidade de pureza na luta política popular. É uma poesia tocante que merece ser recordada aqui, quem sabe para puxar a reflexão de alguns daqueles que atualmente tem força e poder para líderar a caminhada de nosso povo.

Do Povo Buscamos a Força

Agostinho Neto

Não basta que seja pura e justa

a nossa causa

É necessário que a pureza e a justiça

existam dentro de nós.

Dos que vieram

e conosco se aliaram

muitos traziam sombras no olhar

intenções estranhas.

Para alguns deles a razão da luta

era só ódio: um ódio antigo

centrado e surdo

como uma lança.

Para alguns outros era uma bolsa

bolsa vazia (queriam enchê-la)

queriam enchê-la com coisas sujas

inconfessáveis.

Outros viemos.

Lutar pra nós é ver aquilo

que o Povo quer

realizado.

É ter a terra onde nascemos.

É sermos livres pra trabalhar.

É ter pra nós o que criamos

Lutar pra nós é um destino –

é uma ponte entre a descrença

e a certeza do mundo novo.

Na mesma barca nos encontramos.

Todos concordam – vamos lutar.

Lutar pra quê?

Pra dar vazão ao ódio antigo?

ou pra ganharmos a liberdade

e ter pra nós o que criamos?

Na mesma barca nos encontramos

Quem há-de ser o timoneiro?

Ah as tramas que eles teceram!

Ah as lutas que aí travamos!

Mantivemo-nos firmes: no povo

buscáramos a força

e a razão

Inexoravelmente

como uma onda que ninguém trava

vencemos.

O Povo tomou a direção da barca.

Mas a lição lá está, foi aprendida:

Não basta que seja pura e justa

a nossa causa

É necessário que a pureza e a justiça

existam dentro de nós

Enock Cavalcanti, 69, jornalista, é editor do blogue PAGINA DO E desde 2009, a partir de Cuiabá, MT

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Centro Cultural Casa do Centro, do Zé Medeiros e Adia Borges, fecha as portas em Cuiabá. Desmonte da Cultura avança na capital de Mato Grosso

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O fotógrafo José Medeiros e sua esposa Adia Borges não conseguiram mais resistir. A sexta-feira, 3 de setembro de 2025, representou uma data trágica para o Centro Cultural Casa do Centro que eles comandavam na região da Praça da Mandioca, em Cuiabá. Mesmo que com uma noite festiva, marcada pelo som caloroso da banda Calorosa, neste 3 setembro a Casa do Centro, como o equilibrista daquela história, pediu licença – e despencou. Fechou suas portas. Partiu para um outro plano.

Manter espaços culturais como a Casa do Centro se tornou inviável em um Estado tão rico, tão cheio de grana, mas que prioriza investir seus recursos em rodeios e cavalgadas no interior, ou na construção em Cuiabá de um Parque Novo Mato Grosso, espaço preferencial para corridas de carros e de karts, e o desfile garboso de uma elite endinheirada. A lógica da Cultura no Estado, pelo que vejo, é a lógica do parque de diversão e, com isso, os projetos de diversidade como a Casa do Centro, que abria sua portas para mostras de arte, bandas e jovens cantores mato-grossenses, performances culturais e lançamentos de livros e muitos sonhos artísticos, parece que acabam ficando relegados ao último plano.

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Cadê os editais planejados para estimular e multiplicar centros de cultura, não só em Cuiabá mas em todas as regiões do Estado? A cultura em Mato Grosso virou uma espécie de garimpo em que o sertanejo parece que sempre vale mais pelos votos que é capaz de multiplicar.

Curioso é que o gabinete do parlamentar conhecido como “deputado da Cultura’ ostenta nas suas paredes belos e estilosos quadros do consagrado artista que é o fotógrafo Zé Medeiros. O gesto deveria sinalizar apreço pelas artes e respeito à memória cultural de Mato Grosso. No entanto, quando o assunto era fortalecer espaços culturais que sobrevivem a duras penas, como o Centro Cultural Casa do Centro, no coração do Centro Histórico de Cuiabá, o apoio não veio. As palavras e promessas do deputado Alberto Machado (UB), o Beto Dois a Um, que foi um artista musical antes de se tornar um político da situação, ficaram perdidas em algum espaço recôndito entre a Assembleia Legislativa e o Palácio Paiaguás.

O contraste entre a imagem cuidadosamente exibida no gabinete do político midiático e a ausência de políticas concretas para garantir a sobrevivência de instituições culturais revela uma contradição dolorosa. Não basta adornar paredes com obras de artistas locais: é preciso assegurar que espaços de resistência e de produção cultural tenham condições de existir e se multiplicarem. E todo mundo sabe da ascendência que Beto Dois a Um tem sobre os centros de poder neste Estado, espaços em que se definem os rumos dos investimentos culturais neste território mato-grossense. 

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A Casa do Centro, registre-se, lutou bravamente para manter suas portas abertas, oferecendo à capital e a todo Mato Grosso um espaço de memória, arte e convivência. O silêncio e a falta de ação diante da tocante fragilidade com que a Casa do Centro procurava dar concretude a suas utópicas propostas de aggiornamento, expõem o vazio do discurso oficial.

 

ENOCK CAVALCANTI, 72,  é jornalista e editor do blogue PÁGINA DO ENOCK, que ele edita a partir de Cuiabá, Mato Grosso, desde o ano de 2009

Banda Calorosa, junto com Paulo Monarco e DJ Muluc, animou  a noitada de despedida da Casa do Centro. 3 de setembro de 2025

 

 

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