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O melhor detergente é a luz do sol

ENOCK CAVALCANTI: Lá se foi Marcos A. Moreira (Vila), mestre do jornalismo questionador

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O melhor detergente é a luz do sol

Lá se foi Marcos A. Moreira (Vila), mestre do jornalismo questionador

 

O jornalismo de Mato Grosso acaba de perder, aos 77 anos, Marcos Antônio Moreira, o Vila, sem dúvida o mais competente questionador de tantos jornalistas que já escreveram nesta terra.

Feroz articulista, desde os tempos do “Correio da Imprensa”, nos tempos sombrios da ditadura militar, Vila morreu como viveu, teimosamente, se recusando a tratar do câncer que, devido ao hábito de fumar como uma chaminé, acabara tomando conta de sua garganta.

Teimoso e provocador. Vila sabia como ninguém concatenar as palavras, formar frases que sacudiam as consciências, divulgar manchetes sempre feitas para abalar os ídolos de pés de barro. Ele que, no início deste século 21, fazia sempre estremecer as estruturas da política mato-grossense, com suas abordagens coruscantes, notadamente na Era Maggi, a Era da Botina, como denominava, foi perdendo o vigor com o avanço da idade, e acabou isolado em um quartinho do bairro Colorado, em Cuiabá, cuidado por um casal de amigos e pelo amigo Zé Campos, companheiro do “Correio da Semana” que nunca, nunca se afastou dele, nunca o deixou pra trás. Amigo é pressas coisas.

O seu velório, na segunda-feira, 13 de maio de 2024, teve apenas a presença do amigo Zé Campos e familiares do Zé, porque a morte foi súbita e o corpo teve que ser levado às pressas, do Hospital Júlio Muller para o cemitério dos pobres, no bairro São Gonçalo, em obediência à orientação da médica legista, devido ao avançado processo de decomposição provocado pela doença. O jornalista virulento, inquieto, sempre desafiando o mundo e seus poderosos, morreu como morrem muitos dos brasileiros, muito sozinho, talvez como um tigre desdentado. E seu corpo foi repousar junto ao de tantos mortos anônimos enterrados nesta cidade de Cuiabá. Algo deve ser feito para lhe garantir um repouso mais digno, com uma campa funerária que documente a importância de sua trajetória. Marcos Antônio Vila pode ter terminado sua vida isolado, mas nós outros, que sobrevivemos a ele, não podemos o tratar como um qualquer.

Sozinho? Marcos Antonio Moreira não fazia muita questão de companhia. Eu, Enock Cavalcanti, foi um dos que ele afastou, quando assumiu, em seu SuperSiteGood, uma postura de tronitroante questionamento à política expressa pelo PT, pela esquerda brasileira, pelo lulismo. Ele nunca escreveu isso mas me apontava como um dos marionetes do lulismo, vejam vocês. Acho que ele simplesmente se cansou do papo, de todo tipo de diálogo. Ignorou as tentativas que fiz de entrevistá-lo, de abrir espaço para suas manifestações, de lhe cobrar um contraditório. Ele morreu e eu fico aqui sentindo falta de nossas conversas, de curtir sua ironia apurada.

Para desafinar o coro dos contentes, Vila muitas vezes parecia favorecer o bolsonarismo, os extremistas da direita, com suas provocações, imagino que só para tirar o sono dos “cumpanheiros”, petistas e quejandos.

A verdade é que o Vila não tinha limites, não gostava de quem lhe impunha limites. Quando fazia críticas que ele julgava bem fundamentadas em seus textos; se recusava solenemente a dar espaço para o outro lado, como mandam as regras do jornalismo protocolar, argumentando que o outro lado, se quisesse se manifestar, deveria procurar o balcão do Fórum. “O outro lado é o balcão do Fórum” – era uma de suas provocações mais saborosas. Vila defendia com unhas e dentes as suas verdades – ainda que muitas vezes fossem farsas de estilo.

Para contar a história deste personagem e do seu jornalismo, seria bom que o Click MT – SuperSiteGood fosse recolocado no ar, e os seus muitos anos de postagens ficassem à disposição de quem se disponha a conhecer como é que se faz uma provocação jornalística articulada com competência e num rico linguajar. Será que nas faculdades de jornalismo de Mato Grosso alguém fala ou falará dele? Espero que sim, para o bem-estar do nosso jornalismo.

Com o adoecimento progressivo do Vila, a hospedagem do Click MT talvez não tenha sido paga, muitos dos seus links se perderam e o que temo é que o muito que o ativo jornalista escreveu, produziu, ao longo de sua atuação como blogueiro, não possa mais ser restabelecido para o amplo conhecimento de todos. Seremos tão incompetentes para permitir que isso aconteça?!

Fico imaginando para que é que existem Instituto do Patrimônio Histórico e Geográfico em Mato Grosso, o Arquivo Público do Estado e o Instituto Memória da Assembleia Legislativa de Mato Grosso se a memória do notável jornalista Marcos Antônio Moreira pode ser apagada assim, dessa maneira, sem mais aquela. Vila não é um personagem qualquer. Vila merece ser estudado – e, quem sabe, inspirar jornalistas de um futuro mais promissor. “Não queria ser o dia, só a alvorada/ Muito menos ser o campo, me bastava o grão/ Não queria ser a vida, porém o momento/ Muito menos ser concerto, apenas a canção”.

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Alguém precisa fazer alguma coisa para garantir que o acervo do Click MT, do SuperSiteGood não se perca dessa forma tão constrangedora. Deve existir em Mato Grosso alguém com lucidez suficiente para cumprir esta tarefa.

A trajetória do Vila, se bem me lembro, eu que sei tão pouco dele, começa no Jornal de Londrina onde fez parte da equipe que enfrentou a brutalidade da censura, sob a ditadura militar. Como veio parar em Mato Grosso, se algum dia ele me contou, já me esqueci – mas alguém precisa resgatar toda esta história. Sua passagem pelo “Correio da Imprensa”, em Cuiabá, jornal que teve sua redação e oficinas atacadas e empasteladas sob o governo do governador nomeado pela ditadura Frederico Campos é uma história que ainda está aí para ser devidamente retratada.

Eu convivi com o Vila na redação do “Correio da Semana”, ali no prédio da Mitra Diocesana, na Travessa Antônio João, ao lado da Livraria Janina, onde também encontrava o Zé Maia de Andrade, o Eduardo do Espírito Santo, o Vanderlei Meneguini, o Jê Fernandes, o poeta Ronaldo Castro, a Mara Carnevale. Esta é uma redação que, à exceção da Mara, já está toda ela morta, enterrada e esquecida, no cenário jornalístico de Mato Grosso. Com a debacle do “Correio da Semana”, Marcos partiria então para o seu Click MT, saite pioneiro no questionamento dos poderosos de plantão.

O SuperSiteGood saiu do ar mas nesta PAGINA DO ENOCK reproduzi algumas de suas matérias que servem como mostra dos textos habilidosos que ele divulgava.

Vejam só o que escreveu sobre o multimilionário sojicultor e ex-governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, que ele chamava de “Soja Majestade” e “Santo do Pau Oco” e que hoje vive contando dinheiro lá em Santa Catarina:

PARA PERCIVAL LER E INVESTIGAR – Para jornalista Marcos A. Moreira, regularização da PCH Nhandu no governo de Blairo Maggi, que pagaria pretensa dívida eleitoral com o pecuarista Antonio José Junqueira Vilela pode ser um caso de “corrupção cristalina” – PÁGINA DO ENOCK (paginadoenock.com.br)

Corrupção cristalina
POR MARCOS ANTONIO MOREIRA – DO CLICKMT

2006, reeleição de Soja Majestade. Governador-candidato pediu o “enganjamento” do pecuarista Antonio José Junqueira Vilela — o “AJJ” — no “esforço” de campanha, vamos resumir assim, acenando com a regularização da PCH Nhandu de propriedade do mega-criador no Parque Estadual do Cristalino, na Amazônia de Mato Grosso.

AJJ se esforçou muito — e bota “se esforçou” e bota “muito” nisto! –, com direito a ceder avião por conta e “outros ingredientes”.

“Meu ex-Rei” acabou reeleito no primeiro turno e deu pra negacear: não recebia o esforçado AJJ em Palácio, nem atendia ou retornava telefonemas.

O pecuarista apelou até para a amizade com o neo-cunhado do governador, Josino Guimarães, para intermediar um encontro. Nada!

Foi a conta. AJJ — que vem de uma família acostumada a agarrar boi brabo no muque — não teve dúvidas: em maio de 2007, após nova decepção, pegou seu jatinho e rumou para o aeroporto Marechal Rondon. No hangar, colocou o governador no brete.

Diante de secretários, aspones, seguranças e puxa-sacos, só não chamou o senhor Blairo Borges Maggi de santo e rapadura. De resto, esgotou o repertório de todas aquelas palavras e expressões não dicionarizadas.

Encantoado, Soja Majestade não esboçou reação. Engoliu tudo caladinho da silva, como convém a quem não assiste razão alguma. Afinal, AJJ não foi a seu encontro propor nada e, sim, o contrário.

Well…

Dá pra imaginar o que se passou, então: Soja Majestade “encheu a bombacha”, pois tratou de dar logo um jeito no corpo, mobilizando o escritório de representação do grupo Amaggi no CPA, digo, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, para “arresolver” o “pobrema” de AJJ.

Resumindo:

O corrupto saindo à caça de corruptor; cobrando — e recebendo — adiantado e, depois, tentando tirar o seuzinho da reta, é mais uma das “quebras de paradigmas” da Era da Botina…

Voltaremos à carga.

fonte – CLICK MT

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DEU NO DIÁRIO DE CUIABÁ
(3 DE JUNHO DE 2007)

CRISTALINO   

Em 3 dias, Sema suspende e revalida usina

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A hidrelétrica Nhandu, construída dentro do parque com a maior biodiversidade da Amazônia, é suspensa, mas novamente autorizada a prosseguir. A porção do Cristalino onde vem sendo erguida a pequena hidrelétrica é justamente aquela que a AL tentou excluir

RODRIGO VARGAS
DO DIÁRIO DE CUIABÁ

Em um intervalo de 72 horas, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA) suspendeu e depois revalidou as licenças prévia e da instalação da usina hidrelétrica Nhandu, que vem sendo construída dentro do Parque Estadual do Cristalino (localizado no extremo-norte do Estado, entre os municípios de Alta Floresta e Novo Mundo).

A primeira portaria, assinada pelo secretário Luiz Henrique Daldegan, foi publicada na última terça-feira no Diário Oficial. A segunda, revogando a suspensão, na edição de sexta. Ambas se amparam em justificativas técnicas e jurídicas (ver matéria). O mesmo não se pode dizer em relação às licenças.

O Parque Estadual do Cristalino – que abriga em seus 184 mil hectares uma das maiores reservas de biodiversidade da Amazônia –, é uma unidade de conservação de proteção integral, categoria que não permite qualquer tipo de empreendimento ou exploração, ainda que sustentável, em seu perímetro.

Recentemente, o parque esteve ameaçado de redução por obra de uma lei aprovada pela Assembléia Legislativa no final de 2006. A medida extirpou 27 mil hectares do traçado original, excluindo áreas de grande interesse ecológico e trechos desmatados após a criação da unidade.

A nova demarcação resultou em benefício direto a três grandes proprietários rurais da região. Em grande medida, ao fazendeiro paulista Antônio José Junqueira Vilela – detentor da maior multa ambiental da história da Sema, em função de desmates nas áreas protegidas do parque.

Vilela é o proprietário da PCH Nhandu, cujo canteiro de obras se localiza a cerca de 800 metros da linha divisória da unidade. Como a redução foi suspensa, em caráter liminar, por decisão da Justiça (ver matéria), a obra continua a ocupar parte de uma área de proteção integral.

A discussão sobre validade do licenciamento, porém, não depende dos rumos que possa tomar o processo judicial em tramitação. Conforme apontou reportagem do Diário em fevereiro, os documentos foram obtidos seis meses antes da tentativa de redução.

Foram concedidos, portanto, sobre áreas protegidas, como apontam pareceres contrários emitidos pela própria Superintendência Jurídica da Sema, em janeiro e fevereiro de 2006. “A administração poderá revogar as licenças expedidas por motivo de oportunidade e conveniência (…) face ao princípio da supremacia do interesse público”, diz um trecho da primeira manifestação, homologada em 27 de janeiro de 2006.

O segundo parecer foi solicitado pelo então secretário de Meio Ambiente, Marcos Henrique Machado, em função de um pedido de reconsideração formulado pela empresa Usina Elétrica do Nhandu Ltda, que alegava existir direito adquirido.

A empresa lembrou ter obtido as licenças prévias e de instalação para o empreendimento um ano antes do decreto que ampliou o Cristalino de 66 mil para 184 mil hectares, abrangendo a área prevista para a obra.

O pedido trazia anexado um ofício do então presidente da Assembléia Legislativa, Silval Barbosa, que antecipava o teor do projeto de lei de redefinição do parque e ainda assegurava que “a área da PCH Rochedo” estaria fora dos novos limites.

Consultada, o Jurídico da Sema emitiu no dia 2 de fevereiro um novo parecer negativo à renovação da licença. A simples existência de um projeto de lei, segundo o texto, não produzia efeitos jurídicos.

Em 23 de março de 2006, a empresa protocolou um novo pedido de reconsideração, “face à urgência da conclusão da obra”. Desta vez, Machado deferiu o pedido, sem solicitar novo parecer. A licença de instalação nº245/2006, válida até 2009, foi emitida”

——–

São dezenas e dezenas de textos como esse que compõem o acervo agora tirado do ar do SuperSiteGood. Acervo precioso para a história do jornalismo, e para a própria história de Mato Grosso, que precisa voltar a ser disponibilizado para a melhor informação e o melhor conhecimento de todos e todas de nossa sociedade que valorizem a reflexão sobre os rumos dessa nossa sociedade.

Registre-se que, no final de sua vida, Marcos Antônio Vila contou também com a presença e o apoio constante dos seus amigos o jornalista José Roberto Amador (Bebeto), o publicitário Júlio Valmórbida, o empresário Jorge Pires de Miranda e o velho médico Gabriel Novis Neves.

 

 

Enock Cavalcanti, 70, é jornalista e editor do blogue PAGINA DO ENOCK, editado a partir de Cuiabá MT desde o ano de 2009.

O jornalista e blogueiro Vila, no quarto em que morreu, no bairro Colorado, em Cuiabá

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EDMUNDO LIMA DE ARRUDA JR: Na sucessão de Barroso, Lênio Streck desnivela qualquer outro candidato para vaga no STF

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Não há dúvidas. Lênio Streck é hoje o jurista mais preparado para os desafios naquele padrão Supremo. O STF merece nomes do mais alto nível entre nossas mentes na área do Direito.

A escolha é política e causa uma mistura de surpresa e espanto ao pipocar de nomes: o Advogado geral da União, Jorge Messias, preparadíssimo, parece forte, mas ainda consolidando seu nome no meio jurídico.

A Janja quer, por critérios de amizade, Carol Proner, esposa de Chico Buarque, pouco expressiva em trabalhos com a técnica jurídica e na teoria da hermenêutica constitucional.

Lenio talvez seja grande demais para merecer a confiança de Lula num contexto no qual nosso presidente já se decepcionou com muitas de suas escolhas e se vê pressionado por uma militância conhecida… .

Lênio desnivela qualquer outro candidato, por melhor seja o currículo de muitos disponíveis, por erudição, produção acadêmica e técnica, visão crítica, múltiplas capacidades no raciocínio jurídico, sobretudo, pela coragem e criatividade nos fundamentos da interpretação constitucional.

Em cinco anos produziria uma revolução na nossa mais alta Corte.

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Edmundo Arruda, sociólogo e jurista, nascido em Cuiabá, MT, vive há tempo em Florianópolis, SC

 

Lênio Streck com Edmundo Arruda em solenidade em Florianópolis

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