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O melhor detergente é a luz do sol

BENITO CAPARELLI: Anotações sobre o precioso cinema que tem sido produzido no Brasil

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O melhor detergente é a luz do sol

“AMOR À LIBERDADE…AMOR À 

LIBERDADE” (Nelson Pereira dos Santos)

Com a repetição deste corajoso e audacioso brado ufanista, “Amor à Liberdade” e, novamente, “Amor à Liberdade”, o cineasta em destaque, Nelson Pereira dos Santos, a meu sentir, quis deixar, claro e evidente, seu legado personalista, como cidadão brasileiro, nos derradeiros e outonais instantes de sua existência.

Inicialmente, como político partidário, de agremiação ideológica, injusta e ilegalmente considerada como subversiva, nos albores de sua juventude.    

Transparecendo, destarte, como divisão de etapa temporária, comportamental, ao seu engajamento, como a ela filiado.

Então, a primeira alocução se refere à sua ansiosa e fatigante pugna, para aferir liberdade, por defender tese ideológica, em busca de uma sociedade autóctone, mais humanitária, mais altruísta e fraternal; mais igualitária, e menos sofrida; por ele e pelos seus conterrâneos, assim excluídos.   

A segunda, dessa alocução, restando, obviamente inferida, por transparentemente notória, se destinou a demonstrar sua repulsa e indignação, à sórdida e infausta ditadura, imposta a uma nação pacífica e democrática, não merecedora dos injustificáveis e angustiantes sofrimentos, que, a todos nós, foram impostos, por padecimentos prolongados, por mais de duas décadas, e sem liberdade.

Sobre esse diretor cinematógrafo, escreveram as sociólogas, Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling, em sua notável obra, “Brasil: “Uma Biografia”, Ed. Companhia Das Letras, p. 419, que: 

“Em 1955, porém, um jovem cineasta, Nelson Pereira dos Santos, encontrou a forma de levar para dentro de um filme a dura realidade de um Brasil pobre, marcado por fundas desigualdades sociais, e resumiu, em linguagem cinematográfica, a proposta de Celso Furtado de pôr, em evidência, o lugar do subdesenvolvimento, para melhor enfrentá-lo. O filme “Rio 40”, graus rompeu com estética hollywoodiana, apostou num tipo de produção artesanal, rápida e barata, abusou de externas e reuniu um elenco de atores não profissionais.”  

     Falo do golpe militar de 1964.

Se, por outro viés, de conclusão dialética, poder-se-ia argumentar, que se esse estado ditatorial, possibilitou alguma, ou a única razão, para se afirmar, que teria feito algum bem, foi a oportunidade auferida pelos cineastas e cinéfilos, de produzirem bom filmes, denunciando tais atrocidades, dentre os quais, destacamos os abaixo arrolados, para dizer, tal-qualmente, que o artista, ou um artista, cria sua obra a partir de dado pessoal, de certa composição de vida e do mundo.

Não visa o mercado para, dentro do formulado adotado ou apreendido, agradar o público e ter sucesso comercial, assim:

“JARDIM DE GUERRA” (1968) do diretor, Neville d‘Almeida;  

Este filme estrutura-se sobre dois seguimentos, ficcionais distintos, conquanto ligados pela mesma personalidade.

Poderia, cada um deles, constituir obra autônoma, tais suas diferenças. 

Num, tem-se o protagonista interpretado pelo, também diretor, Joel Barcelos, sua disponibilidade vivencial e a descoberta do amor. 

No outro, essa mesma personagem às voltas com a franja criminal da sociedade.

Em outro, a poeticidade formada pela juventude e o amor, em episódio nimbado de delicadeza e poesia.

Noutro, sua negação à brutalidade da atuação repressiva, dos autodenominados e pretensos defensores da ordem.

Por último, denuncia o domínio da força e da desnaturada violência desencadeada, organizada criminosamente, sob pretexto de combater o que define como crime, que mais não é, comumente, do que relação de revolta contra o iníquo domínio.  

   

“PRATA PALOMARES” (1970), do diretor, André Faria Junior;   

O cinema brasileiro, nos fins da década de 1960, e inícios da seguinte, abandonou as propostas de cinema novo, enveredando por caminho diverso.

Se aquele divergia da visão do país, conforme os interesses e parâmetros de suas classes dominantes e de seus associados estrangeiros, ou vice-versa, o cinema marginal, como ficou conhecido, estava livre de tudo, inclusive, e principalmente, do gosto (mau gosto ou falta de gosto) do espectador, não lhe interessando, em nenhum momento e por qualquer motivo, sua reação e, menos ainda, sua opinião.

Desembaraçados, pois, desse e de outros entraves, os cineastas dessa tendência buscavam menos a verdade da natureza humana, do que sua própria verdade, marcada pela incerteza, sufoco político, falta de perspectivas, às vezes, desorientação, revolta e outras tantas.

Só neste contexto, é que se pode compreender a realização de filme como A PRATA PALOMARES (1970), de André Faria Junior (Ourinho, SP, 1944), com roteiro do Diretor José Celso Martinez Correia, algo imaginável e fora de sua época, não por ser datado, o que não é, mas por não ser possível antes de seu tempo, por falta de condições sociais e políticas ensejadoras dessa explosão de revolta, mesclada com perplexidade, arrebatamento, vigor, extrema coragem intelectual e, à época, também física.     

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“PRA FRENTE BRASIL” (1991), do diretor, Roberto Farias; O Sofrimento dos Inocentes.

O gênero ficcional, e arte, é iluminado, tanto temática, quanto formalmente. De seu grau de informação, sensibilidade, capacidade e audácia.

Contudo, quando se diz que pode a ousadia temática, sem a correspondente contrapartida formal, essa circunstância só atinge, ou contempla os fatores morais e, ou, políticos dos assuntos.

É o caso, por exemplo, do filme Pra Frente, Brasil (1980) de Roberto Farias, demonstrando ser corajoso, lúcido e desassombrado ao tocar o nervo exposto da ditadura militar, implantada no Brasil, a parir de abril de 1964.

Se a ditadura não conhece limites, Pra Frente, Brasil, o filme, não conhece menos, expondo criticamente a estrutura e a prática da tortura no Brasil, por volta de 1970, simultaneamente com o desenrolar da Copa do Mundo, ocorrida naquele ano, sendo, como se sabe, seu título extraído de letra e música atinente ao fato. 

O BOM BURGUÊS” – Procedimentos Humanos (1982) do diretor Osvaldo Caldeira.

Os anos de guerrilha e repreensão, que caracterizaram parte do período em que predominava, no país, o regime ditatorial, instalado em 1964, vem sendo focalizados pelo cinema.

Nem, ao menos, encerrada a fase, ainda no governo do último de seus presidentes, João Batista Figueiredo, surge filmes sobre o tema.

Por essa ocasião, surge, também, o filme O Bom Burguês (1982), de Osvaldo Caldeira (BH/MG,1943), partindo de ação e situação de bancário que, por meio de desfalque, financiava, simultaneamente, o Partido Comunista Brasileiro e a guerrilha, então, dois agrupamentos oposicionistas rivais, a ponto de o primeiro considerar que a ação do segundo só serviria para justificar e reforçar o aparelho repressivo da ditadura.

O protagonista, no entanto, não se contenta apenas com essas ligações, e, em ação, não muito bem explicada, enreda-se, também, com grupo de ultradireitista, repressivo e paramilitar.

   Com essas triangulações explosivas, Caldeira tece sua trama, politicamente rocambolescas, totalmente centrada na participação e movimentação dessas personagens, com leve abertura para a situação de sua irmã guerrilheira.

“NUNCA FOMOS TÃO FELIZES” “A significação dos Fatos” de Murilo Sales (1984)

Que o cinema não é diversão, já se sabe, embora a maioria absoluta dos espectadores, moldados e condicionados pela indústria do entretenimento pense o contrário.

Isto vem a pêlo quando se fala de um filme, como o “Nunca Fomos Tão Felizes” (RJ/1984) de Murilo Sales (1950), pautado segundo os padrões artísticos.

A estória e seu enfoque, bem como a maneira de estruturá-lo e conduzi-lo, não são de molde a permitir inconsequências, só legítimas (e necessárias), em seu campo próprio, a exemplo das funções circenses e à prática amadorística e assistência de jogos esportivos, em geral.

O filme de Sales, baseado no conto de João Gilberto Nol, por constituir de obra de arte, trata com seriedade assuntos mais sérios, quais sejam a militância política exacerbada terrorista, a repressão ditatorial e, neste contexto conturbado, o que sobra do relacionamento entre pai e filho, e o faz de forma inteligente, suscitando mistério e criando expectativa, que se entrelaçam e autoalimentam-se, sincrônica e simetricamente.   

“QUE BOM TE VER VIVA” (1988), da diretora Lúcia Murat;

Arte e Verdade.

O cinema e a literatura, como não poderia deixar de ser, têm tematizado de inúmeros modos e maneiras as ocorrências, diretamente ligadas às atividades dos governos militares ditatoriais, que assumiram o poder no Brasil, em 1964.

No cinema, na década de 1980, particularmente, enfocam essa fase histórica, que muitos analistas consideram uma tragédia nacional, insuflada e apoiada pelos Estados Unidos, por razões geopolíticas globais e para não perderem o domínio político, a administração e a exploração das riquezas naturais e os mercados da região.

Destacam-se, no Brasil, como levantamento crítico desse período os filmes retro relacionados, dentre esses, “QUE BOM TE VER VIVA” (1988), de Lúcia Murat (RJ 1949), que é um documento articulado ficcionalmente, visto e estruturado sobre elementos de ambos os gêneros, como prevalência documental. 

A cineasta compõe sua narrativa conjugando esses dois módulos, harmonizando e alternando as intervenções de militantes políticos torturados nas prisões da ditadura (devidamente nomeadas e identificadas), com sua posição pessoal sustentada pela atriz Irene Ravache.      

 

“CORPO DE DELITO” (1990), do diretor Nuno César Abreu; “A crítica da história”

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O fato histórico de certa relevância, mais cedo, ou mais tarde, é objeto de ensaios e obras de ficções, independentemente de sua análise por historiadores.

O cinema brasileiro não foge à regra e já são diversos filmes baseados em acontecimentos da história do país.

Contudo, fatos importantes ainda permanecem intocados, ou apenas parcialmente referenciados, a exemplo das célebres insurreições e revoltas, impropriamente denominadas de revoluções.

O filme CORPO DE DELITO (1990), de Nuno César Abreu (Araçatuba/P 1948), não é histórico, mas, a partir da atuação de um médico legista, focaliza o sombrio aspecto das torturas e assassinatos cometidos nas prisões civis e militares, implantados no país, notadamente, depois do Ato Institucional Número 5, (AI 5), em dezembro de 1968.

“LAMARCA” (1994) do diretor Sérgio Resende;

O Posicionamento Humano.”

Quem duvida das potencialidades profissionais e técnicas, não apenas no cinema brasileiro, mas dos brasileiros para fazer cinema e de seu eterno ressurgir das cinzas, das crises periódicas, gerada pelo domínio do mercado de filmes importados norte-americanos, além de outros exemplos da década de 1990, ainda tem, contrariar esse ponto de vista, o filme LAMARCA (1994) de Sérgio Resende (RJ 1951), diretor de, entre outros, O HOMEM DA CAPA PRETA (1985).

Para além, muito além, das divergências ideológicas, do levantamento temático e sua interpretação, tem importância, no caso (como em todo e qualquer coisa da espécie), a qualidade do filme.

Sob esse aspecto, LAMARCA caracteriza-se pela segurança diretiva que dá à narrativa fluência e consistência.

A inteireza do filme é absoluta. Não há decaídas, nem desníveis. Tanto no presente, como nos inúmeros, pertinentes e necessários retrospectos, tanto nas cenas urbanas, como nas cenas em florestas, na chapada baiana e nos pequenos lugares que a orlam, o que se tem é filme vigoroso.

“O QUE É ISSO, COMPANHEIRO?” do diretor Bruno Barreto; “Os fatores de um filme.”

Quando uma obra de ficção se baseia em acontecimento real, o mínimo que se pode exigir é a fidelidade dos fatos.

Contudo, não é só isso. Mas, também, isenção.

Claro, obra de arte é obra histórica, que, também, requer tais atributos. Quase poder-se-ia dizer, com mais razão.

Mas, não com mais razão. É que o artista, ao enveredar pelo caminho do acontecido, tem iguais responsabilidades.

É claro que se limita ao restringir o foco de atenção ao fato real. Nada o obriga, todavia, a elegê-lo como objeto de sua arte. Se o faz, automaticamente arca com o ônus daí decorrentes. 

O filme “O QUE É ISSO, COMPANHEIRO?” (1996) de Bruno Barreto (RJ 1955) extraído do livro homônimo de Fernando Gabeira, focalizando o sequestro do embaixador Charles Elbrick, carrega, assim, de sua origem, por ser ficção, cujo objeto é o ser humano, e por se basear em acontecimento histórico, a dupla responsabilidade de autenticidade humana e veracidade fática, do dever de isenção política-ideológica.

 

“AÇÃO ENTRE AMIGOS” – (1998) Beto Brant.

“A realidade soterrada.”

Em Ação Entre Amigos (1998), Beto Brant (SP/1964), não se restringe aos limites da trama. Se o objetivo fundamental é contar uma estória, como, aliás, era, também, em “Os Matadores” (1995), seu filme anterior, aqui o excede, justamente no que é importante em qualquer realidade artística, conforme explicitado por Hegel: concepção e expressão.

No primeiro caso, a trama não se esgota em si mesma. Suas implicações são maiores e mais vastas, atingindo, simultaneamente o cerne de pelo menos três questões: a militância política, o comportamento e a reação frente a ela das classes dominantes, detentoras da direção do Estado, instrumentalizado e posto a seu serviço e, finalmente, o componente humano, pessoal e emocional da militância política.

No eixo do conflito entre tais fatores, todos os integrantes do mesmo páthos dramáticos, o cineasta os administra e os conduz com segurança e objetividade.

“O ANO EM QUE MEUS PAIS SAÍRAM DE FÉRIAS” (20006), do diretor Cao Hamburger; (não documentado, por ausência de arquivo)

CIDADÃO BOILENSEN” (2009) do diretor Chain Litewsky;  (idem, idem)

P/S – Para não ser esquecido, “VIDAS SECAS”, que conta a história do notável escritor, Graciliano Ramos, padecido pela Ditatura Vargas.  

Benito Caparelli é juiz do Trabalho aposentado e vive em Cuiabá, MT; em 12/2024   

 

Nelson Pereira dos Santos dirigindo Grande Otelo no filme “Rio, Zona Norte” (1957). Bretz Filmes/Divulgação

 

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FOME AMEAÇA PESCADORES EM MT: Pedidos de inconstitucionalidade do Cota Zero no STF tramitam há quase dois anos sem respostas

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Lentidão processual do caso contribui para a continuidade de violações sofridas por pescadoras e pescadores em Mato Grosso

“Quem tem fome, tem pressa”, foi uma das frases proferidas por um pescador em uma das reuniões do Observatório da Pesca da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, em discussão sobre a Lei 12.434/24, o Cota Zero. Se quem tem fome tem pressa, a cada dia que passa, ela só aumenta e, há pelo menos um ano, desde que passou a vigorar a lei em Mato Grosso, ela vem fazendo parte da rotina de milhares de famílias. E quem olha para isso? A inconstitucionalidade do Cota Zero é alvo de três ações no Supremo Tribunal Federal (STF), ajuizadas ainda em 2023. Na terceira reportagem da série “Um ano depois: o que sobrou do Cota Zero em Mato Grosso?”, do Fórum Popular Socioambiental (Formad), a lentidão processual, após a celeridade pela aprovação da lei que proíbe a pesca em Mato Grosso, piora a situação de fome.

Entre a circulação da Mensagem 80/2023 do Governo de Mato Grosso e a aprovação da Lei 12.197/23 foram cerca de dois meses de tramitação na Assembleia Legislativa. A sanção do Executivo foi publicada em julho daquele ano, com o início de vigência da proibição do armazenamento, comércio e transporte de peixes no estado a partir de 1º de janeiro de 2024. Diante do cenário de violações às comunidades ribeirinhas e demais comunidades tradicionais que vivem da pesca, uma disputa judicial foi instaurada e o primeiro ingresso das três Ações Diretas de Inconstitucionalidade protocolado no Supremo Tribunal Federal (STF) foi em outubro de 2023. 

O processo tem como relator o ministro André Mendonça que propôs uma fase conciliatória, encerrada sem acordo entre as partes ainda no primeiro semestre de 2024, já que o governo de Mato Grosso recusou a proposta da Advocacia Geral da União (AGU) para a elaboração de um plano de gestão em parceria com o Ministério da Pesca. A alternativa do Executivo estadual: uma lista de 12 espécies proibidas que, em sua maioria, são as mais rentáveis para quem depende do peixe, a Lei 12.434/24, rapidamente aprovada pela ALMT.

“Houve uma grande preocupação quando ocorreram as duas audiências de conciliação nas ações diretas de inconstitucionalidade, pois sabemos que direitos fundamentais são inegociáveis. A conciliação estava inserida dentro da expectativa do poder executivo estadual de conseguir fazer acordo conforme seu entendimento e ‘sair bem na foto’. Contudo, durante esse período de conciliação, sem diálogo, o poder executivo estadual atravessou, unilateralmente, um projeto de lei, aprovado às pressas pela casa legislativa. Essa postura do poder executivo estadual indica que o apagamento e silenciamento da pesca artesanal no estado obedece à necropolítica instaurada em face dos pescadores e pescadoras artesanais”, analisa Bruna Medeiros Bolzani, advogada do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad). 

Leia Também:  Urbanista José Antonio Lemos leu e gostou do que o prefeito Mauro Mendes escreveu, por ocasião do aniversário de Cuiabá. E sauda a disposição de Mauro Mendes em assumir, institucionalmente, Cuiabá como a capital do agronegócio e do turismo. "É fundamental que a cidade institucional se compatibilize com a cidade real. A nova visão proclamada pelo prefeito pode ser também a indicação de novos e melhores tempos para a cidade"

Criado há mais de 30 anos, o Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad) é uma rede de organizações da sociedade civil que vem acompanhando o Cota Zero desde a sua tramitação, incluindo o pedido de habilitação na ação judicial como amici curiae, o acompanhamento processual, construção de análises, monitoramento, busca por informações por meio da Lei de Acesso à Informação, matérias jornalísticas, entre outros. Até hoje não foi julgado o agravo interno protocolado em agosto de 2024,  contra a decisão do ministro André Mendonça, que rejeitou o pedido de suspensão dos efeitos das duas leis do Cota Zero até a decisão final das ações. Quase um ano depois, o recurso continua sem apreciação pelos demais ministros.

O tempo passa e as dificuldades aumentam

Tendo 32 anos de carteira profissional como pescador, Benedito Ribeiro, da Comunidade Vereda, de Santo Antônio de Leverger (MT), prevê para 2025 os mesmos problemas vivenciados desde o início da vigência do Cota Zero, ou até piores. “Eu nasci na beira do rio, vim de três gerações de pescadores. Não tenho outra renda além da pesca. O governo tinha que saber como as pessoas aqui vivem pra saber o impacto dessa lei. Nós passamos o ano comendo ovo, arroz e feijão para sobreviver, com contas atrasadas, familiares com depressão. Ninguém sabe mais o que fazer e só nos resta esperar alguma decisão lá de cima”.

O “lá de cima” a que ele se refere é o Supremo Tribunal Federal (STF), que  segundo dados do Corte Aberta, o Portal da Transparência do órgão, soma 19.292 processos até maio de 2025. Com quase 2 mil ações, o ministro André Mendonça é o que possui o terceiro maior número de processos sob sua relatoria. Em média, de acordo com a plataforma do STF, o tempo de tramitação dos processos é de 388 dias, ou seja, pouco mais de um ano. As ações de inconstitucionalidade do Cota Zero encontram-se entre os mais de 6,7 mil processos sem decisão final e que dependem ainda de algumas fases como decisões colegiadas. 

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“Em outubro de 2023, o ministro relator adotou o rito abreviado no caso, com base no artigo 12 da Lei nº 9.868/1999, considerando que a análise judicial deveria ser tomada em caráter definitivo, o que significa que já poderíamos ter avançado significativamente no processo, mas ainda aguardamos o julgamento do recurso de agravo interno. Até o momento, o caso não passou por decisão colegiada nem pelo Plenário do STF, tendo somente decisões do ministro relator”, pontua Bruna Bolzani. 

Para a advogada do Formad, o panorama institucional é favorável à declaração de inconstitucionalidade das duas leis do Cota Zero, já que órgãos federais como a Advocacia-Geral da União, Procuradoria-Geral da República, Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, Defensoria Pública da União, Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima por meio da Secretaria Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável, Ibama e também o Ministério da Pesca e Aquicultura já manifestaram este posicionamento. 

“É lamentável que, embora tenha sido adotado o rito abreviado para que o caso tramitasse de forma mais célere e o processo já esteja maduro para julgamento, haja essa demora, porque diz respeito à sobrevivência econômica, dignidade e segurança alimentar de milhares de famílias”, acrescenta.

Acompanhe a nossa série

Na reportagem a seguir: conhecido por seu enorme potencial hídrico, Mato Grosso tem, na disputa pelo poder das águas, um grande entrave. E onde entra o Cota Zero nisso? O que a proibição do exercício da pesca no estado tem a ver com a expansão de empreendimentos hidrelétricos e outras atividades exploratórias? A quem interessa desmobilizar comunidades ribeirinhas e a sua defesa pelos territórios?

“Um ano depois: o que sobrou do Cota Zero em Mato Grosso?” é uma série de reportagens assinada pela jornalista Bruna Pinheiro e produzida pela Secretaria Executiva do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), rede composta por quase 40 organizações socioambientais do estado e que acompanha o Cota Zero desde o início da sua tramitação. O Formad está entre as entidades da sociedade civil que atuam na mobilização de pescadoras e pescadores em Mato Grosso, além do apoio jurídico ao processo e o combate à desinformação do caso. 

FONTE – https://formad.org.br/

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